É possível mudar São Paulo sendo coerente
Por Maurício Costa de Carvalho, em PSOL São Paulo
Caro Eduardo Guimarães,
Há alguns dias, após um debate promovido pela Revista Fórum, você escreveu uma “carta aberta” ao candidato a prefeito do PSOL em São Paulo Carlos Giannazi. Embora teça elogios pessoais ao psolista, sentimos que a ideia da “carta” é mais um esforço de tentar colar em Giannazi a pecha de “bom político, mas incapaz de governar” e assim indiretamente ocultar as imensas contradições da candidatura Haddad que você defende.
Carlos Giannazi, a quem você tece elogios sinceros por sua trajetória irreparável de luta e coerência, não poderia ser candidato a prefeito nem estar em outro partido. O mesmo pode ser dito de Plínio de Arruda Sampaio, Marcelo Freixo, Luciana Genro, Heloísa Helena e tantos outros, muitos que saíram ou “foram saídos” do PT justamente pelo mais importante de suas histórias: a coerência com suas bases sociais e a convicção de que é possível fazer política sem se vender.
Por tudo isso faço questão de responder em nome do PSOL e de maneira respeitosa e franca a sua carta. Em respeito também àqueles moradores de São Paulo que acreditam na necessidade histórica de superar os seguidos desgovernos da direita elitista representada pelo PSDB, queremos discutir a necessidade de fortalecer uma alternativa que infelizmente o PT de Haddad não representa, precisamente porque fez a opção de moldar sua política na fôrma que tucanos forjaram.
Vamos aos pontos.
O preço das alianças
A afirmação de que o PSOL não faz alianças não é verdadeira e foi prontamente respondida por Giannazi durante a entrevista (aos 39min15s). O PSOL faz alianças, mas com limites e princípios. Vejamos o caso de Maluf. Maior corrupto brasileiro, criminoso procurado pela Interpol, já foi preso, teve seus bens bloqueados, foi condenado a devolver R$ 716 mi aos cofres públicos do estado e ainda deve outras dezenas de milhões que roubou da cidade de São Paulo em suas desastrosas gestões com Pitta e Kassab.
Esse sujeito e seu partido são entulhos da ditadura militar. Maluf construiu o Cemitério de Perus para abrigar as ossadas dos desaparecidos políticos e regularizou o centro de tortura do DOI-CODI. Estamos opostos a Maluf em termos humanitários, políticos, administrativos, éticos, morais… Como então nos aliarmos para um projeto de cidade? Para o PSOL é impossível, para o PT de Haddad não.
As alianças são muito mais do que divisões por tempo de TV. A de Lula com Maluf concedeu ao PP o Ministério das Cidades, terceiro maior orçamento da esplanada, responsável pelas obras da Copa e pela construção de metrôs nas cidades. Hoje é um duto de corrupção do pior tipo, em consórcio com as empreiteiras. Não por acaso as obras da Copa são um desastre e “falta verba” para o metrô em São Paulo. Fico me perguntando qual a secretaria ocupada por Maluf em um hipotético governo Haddad. Das finança$? Das obras? Da segurança, para colocar “a Rota na rua”? Ou da educação, para quem “professora não é mal paga, é mal casada”?
Na esteira da chapa petista a vereadores desse ano está gente como Wadih Mutran, com imensa coleção de escândalos na cidade, tendo “milagrosamente” dobrado seu patrimônio milionário em 4 anos. Qual a diferença entre eleger “a direita demo-tucana e seus satélites” e Mutran? Contando que a maioria dos vereadores da atual legislatura – inclusive vários do PT – são financiados por empreiteiras e construtoras que transformaram a prefeitura e a câmara em reféns, como fazer para mudar esse quadro? Nenhum vereador – do PSDB, do PT ou do PSD – teve coragem de lutar por uma CPI contra a Máfia dos Imóveis de Kassab. Por que será?
Para quem se administra?
Caro Eduardo, nossas diferenças com o PT não são administrativas, como você sugere, são estratégicas, de projeto. Você afirma em sua carta que a redução de gastos da educação em 6% e a criação de taxas que oneravam diretamente os pobres e os trabalhadores no governo petista seriam “medidas administrativas inevitáveis”. Tal visão reproduz uma velha máxima da direita tucana: distribuir as sobras do orçamento para os pobres quando a maré vai bem e retirar direitos dos mesmos – o elo mais fraco da corrente – quando vai mal.
Por que a prefeitura petista não engordou os cofres com a cobrança da imensa dívida ativa de grandes empresas e especuladores? Por que não taxou transações financeiras do município e as grandes fortunas paulistanas? Por que não atacou os corruptos? Diga-se de passagem, a redução de verbas da educação e a criação das taxas do lixo, da luz, etc. foram construídas por Haddad enquanto ele era chefe de gabinete de João Sayad, ex-secretário de Serra, ex-ministro de Sarney e o responsável no governo tucano de hoje por promover o desmonte que a TV Cultura vem passando.
É possível fazer mudanças reais com coerência
Como Haddad poderá ser o novo de São Paulo se recebe R$ 90 milhões na campanha das mesmas construtoras, empreiteiras, bancos e multinacionais que financiam Serra? Ser “factível, racional, prevendo todas as dificuldades” é saber especialmente o preço que se paga pelas opções e compromissos na política.
É justamente por sabermos o preço das alianças e das opções que são feitas na política que optamos por outro caminho, criterioso e coerente. O PSOL é o partido mais bem avaliado do Congresso não só porque tem excelentes quadros, parlamentares, com experiência parlamentar e administrativa como Chico Alencar, Ivan Valente, Jean Wyllys e Randolfe Rodrigues. Nossa virtude é que não abandonamos o que há de vivo na política: a organização independente da sociedade e o compromisso com o povo.
Aliás, foi fundamentalmente assim que Edmilson Rodrigues, atual candidato a prefeito de Belém pelo PSOL com 47% das intenções de voto, governou a cidade em uma experiência que muitos petistas abandonaram. Vale conhecer a história do Congresso da Cidade, da mobilização e dos enfrentamentos feitos por Edmilson que o tornaram a grande liderança popular na cidade. E, por favor, isso nada tem a ver com “um projeto autocrático sob discurso de que um prefeito pode fazer tudo o que quiser coagindo o Legislativo com grupos de pressão”. Essa “reginaduartização” da política não ajuda nem um pouco no debate.
Greve das federais: um exemplo
Cito outro caso que ilustra bastante nosso debate: a atual greve das universidades federais. São quase 100 dias de greve contra um modelo construído por Haddad que se iguala ao projeto educacional do PSDB no governo paulista na expansão precarizada da educação e no arrocho salarial dos profissionais de educação. Ainda pior: como na USP PSDBista, o PT mandou reprimir os estudantes e ainda propôs o corte de ponto dos grevistas. “Modernidade administrativa” você diria? “O pior do modelo de direita da criminalização das lutas sociais”, diríamos nós.
Aliás, pela gravidade do tema, aproveito para fazer um apelo. Nesse momento onde a mídia corporativa simplesmente se calou diante de uma das maiores greves universitárias da história, não consegui achar no seu blog da cidadania nenhuma linha de apoio, de solidariedade, de crítica ao governo por nem ao menos ter sentado para negociar com os professores e trabalhadores das universidades em meses.
A mudança que São Paulo quer
Por fim Eduardo, quero deixar claro que coincidimos em um ponto: São Paulo precisa de mudança e do fim da velha política de PSDB e satélites. Contudo é impossível ser “o novo” que a cidade precisa reproduzindo a essência dessa velha política no financiamento de campanha milionário, nas alianças, na política econômica, nas práticas corruptas, nos candidatos impostos desrespeitando a base partidária e a história do partido, como faz o PT.
A mudança que São Paulo precisa não pode ser pincelar um verniz do “novo” em uma estrutura devorada pelos cupins. E política não é guerra de torcidas, não é competição de marketing nem de quem tem mais tecnocratas. É disputa de projetos, de opções.
E nós acreditamos que é possível, caminhando com os pés firmes no chão, construir uma nova rota em direção a uma vida onde a justiça social e a liberdade não sejam mera fraseologia. Para tanto é necessário que as contradições do deserto do real sejam enfrentadas com independência, firmeza e coerência, o que falta à miséria da política que vemos hoje.
Como disse ao Rovai, espero uma nova oportunidade de debate sobre os projetos de Giannazi e do PSOL para São Paulo.
Saudações ensolaradas,
Maurício Costa de Carvalho
Professor, geógrafo e presidente do PSOL na cidade de São Paulo.
terça-feira, 24 de julho de 2012
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