sábado, 21 de maio de 2011

Novas e inéditas mobilizações na Espanha
Uma praça do Tahir na Europa?
Pedro Fuentes, Secretaria de Relações Internacionais do PSOL

Indignados. Fartos. Dezenas de milhares de pessoas se manifestaram, dia 15 de maio – último domingo – em mais de 50 cidades espanholas. A manifestação foi convocada sob a plataforma cidadã “Democracia Real Já!”. A concentração de maior envergadura ocorreu em Madri, onde milhares de pessoas conseguiram parar o centro da cidade.
“As críticas aos políticos, partidos e banqueiros, ao resgate das entidades financeiras, ao trabalho precário, aos cortes nos gastos sociais, e à atual lei eleitoral eram os lemas estampados nos cartazes”.
“Violência é cobrar 600 euros” dizia um cartaz. 
“Não é uma crise, é um roubo.” lia-se num cartaz carregado por muitos manifestantes. “Foram também constantes as referências à Islândia, onde a população, em referendo, recusou-se, por duas vezes, a pagar pela falência de seus bancos.”, escreveu Ana Requena Aguilar no Diário “Público”.
Segundo a plataforma “Democracia Real Já”, responsável pela convocação da manifestação através do facebook – seguindo o exemplo de Egito e Tunísia – havia mais de 50 mil pessoas nas ruas de Madri, 15 mil em Barcelona e 10 mil em Sevilha. O número informado pela polícia apontada uma participação menor. Mas de qualquer maneira, não há como negar que se passou algo inédito na Espanha. Por fora das organizações políticas e dos sindicatos, plataformas juvenis e cidadãs ganham as ruas e ameaçam permanecer.
Em que pese a repressão do governo de Zapatero e da resolução da justiça proibindo novas manifestações, um grande contingente segue acampado na Praça Puerta del Sol em Madrid e se propõe a ficar por vários dias, até a eleição prevista para o próximo domingo (22 de maio). 
A convocatória da Plataforma (ver anexos) é formada por oito eixos nos quais é feita uma forte denúncia à partidocracia e à corrupção do PP e do PSOE (1). Ela denuncia os banqueiros e ataca os subsídios que receberam do governo; ao mesmo tempo, exige soluções frente ao desemprego e aos baixos salários.
Um dos posts do facebook dizia “Tomem as ruas! Os políticos mentem, os bancos roubam, os patrões exploram, os sindicatos nos vendem, a mídia nos engana” - http://www.youtube.com/watch?v=HKV-LQZVVeA&feature=player_embedded
São novas formas de responder às medidas de austeridade tomadas pelo governo socialista, que incluem um forte ajuste fiscal e corte nos salários, além do aumento da idade de aposentadoria para os 67 anos, entre outras medidas que acabaram de ser negociadas entre o governo e a burocracia sindical da CCOO e da UGT (2).
As mobilizações ocorridas até agora na Espanha, na Itália, na Alemanha, na França, na Inglaterra tiveram um caráter defensivo e de resistência às medidas de ajuste. Foram mobilizações fortes e massivas convocadas pelas centrais sindicais que são controladas por dirigentes reformistas que têm tido como política, a pressão para negociar medidas de ajudes mais suaves.
A novidade da mobilização na Espanha – e talvez, também na Grécia, onde há alguns dias ocorreu a segunda greve geral desse ano – é que, nesses países, a mobilização tem dois aspectos que se destacar: 1) ela possui um caráter político, levanta reivindicações democráticas e anticapitalistas e 2) se constrói à margem – no caso da Espanha – ou ultrapassa os limites – no caso da Grécia – das organizações controladas pelas direções tradicionais, vinculadas à socialdemocracia e aos Partidos Comunistas.
Por isso mesmo, a nova onda de protestos na Espanha parece um contágio das mobilizações que antecederam as revoluções na Tunísia e no Egito. Nesses países, a juventude e o povo se levantaram contra os regimes autoritários e contra a fome e o desemprego que assolavam suas economias impactadas pela crise capitalista mundial.
No velho continente há regimes democráticos burgueses. Mas ainda que não haja ditaduras, a crise econômica é gravíssima e desnuda, cada vez mais, o papel dos velhos partidos no poder, que estão cada vez mais distanciados das necessidades do povo e, por outro lado, mais vinculados às grandes corporações e aos banqueiros.
Seria fazer uma análise voluntarista crer que, a partir dessas novas mobilizações, já estejamos vivendo também as revoluções na Europa; mas seria também um erro – talvez mais grave – não ver as conexões existentes entre os processos vividos nos países de ambos os lados do Mediterrâneo.
A Europa está no centro da crise econômica mundial. Uma crise que tocou toda a estrutura política e econômica da União Europeia, esse grande projeto da burguesia imperialista que, nos anos 80 e 90 aparecia como o melhor exemplo de sucesso, sob o auge da globalização e do neoliberalismo. Hoje, a União Europeia está se afundando, suas classes dominantes mostram sua incapacidade para administrar uma saída para a crise; elas já não podem levar adiante o resgate de suas economias mais débeis – Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda e Finlândia. Já está caindo a livre circulação por suas fronteiras; Dinamarca deixou de lado os progressivos acordos que permitiam essa circulação sem controle.
A situação europeia mudou e, por isso mesmo, essas mobilizações na Espanha aparecem como o aviso de situações que, com suas características próprias e particularidades – dentre as quais destacamos o caráter marcadamente anticapitalista – se produzem nesse continente como um todo.

Propostas de Democracia Real Já!
Não somos mercadorias nas mãos de políticos e banqueiros
Essas são algumas das medidas que, enquanto cidadãos, consideramos essenciais para a regeneração de nosso sistema político e econômico. Opine sobre as elas e traga novas propostas para as plenária!
1. Eliminação dos privilégios da classe política:
Controle estrito do absenteísmo dos cargos eleitos em seus respectivos postos. Sanções Específicas pelo abandono de funções.
Supressão dos privilégios no pagamento de impostos, anos de contribuição e montante das pensões. Equiparação do salário dos representantes eleitos ao salário médio espanhol mais os honorários indispensáveis para o exercício de suas funções.
Eliminação da imunidade associada ao cargo.
Aplicabilidade dos delitos de corrupção.
Publicação obrigatória do patrimônio de todos os cargos públicos.
Redução dos cargos de livre designação.
2. Contra o desemprego:
Distribuição do trabalho, fomentando as reduções de jornada e a arbitragem trabalhista até acabar com o desemprego estrutural (ou seja, até que as taxas de desemprego atinjam menos de 5%).
Aposentadoria com 65 anos e nenhum aumento da idade de aposentadoria até que seja extinto o desemprego juvenil.
Bonificações para empresas com menos de 10% de contratação temporária.
Segurança no emprego: impossibilidade de demissão coletiva ou por causas objetivas nas grandes empresas enquanto haja benefícios. Fiscalização às grandes empresas para assegurar que não contratem trabalhadores temporários para vagas que deveriam ser ocupadas por trabalhadores fixos.
Restabelecimento do subsídio de 426 euros para todos os desempregados de longa duração.
3. Direito à habitação
Expropriação pelo Estado das moradias construídas em estoque que não foram vendidas para colocá-las no mercado em regime de aluguel protegido.
Auxílio aluguel para jovens e para todas as pessoas de poucos recursos.
Que seja permitida o pagamento em espécie das moradias para cancelar suas hipotecas.
4. Serviços públicos de qualidade:
Supressão de gastos inúteis nas Administrações Públicas e estabelecimento de um controle independente de orçamento e gastos.
Contratação de trabalhadores de saúde até que se esvaziem as listas de espera.
Contratação de professores para garantir a proporção adequada de alunos por aula, os grupos de desenvolvimento e grupos de apoio.
Redução do custo da matricula em toda a educação universitária, equiparando o preço de pós-graduação aos de graduação.
Financiamento público da pesquisa para garantir sua independência.
Transporte público barato, de qualidade e ecologicamente sustentável: restabelecimento dos trens que estão sendo substituídos pelo AVE com os preços originários, barateamento dos passes, restrição do tráfego de automóveis privados no centro das cidades, construção de vias para ciclistas.
Recursos sociais locais: aplicação efetiva da Lei de Dependência, redes de serviços locais, encarregadas da educação municipal, serviços de mediação e tutoria local.
5. Controle das instituições bancárias:
Proibição de qualquer tipo de resgate ou injeção de capital em instituições bancárias. Aquelas entidades em dificuldades devem quebrar ou ser nacionalizadas para constituir um sistema financeiro público, com controle social.
Elevação dos impostos aos bancos de maneira diretamente proporcional ao gasto social ocasionado pela crise gerada por sua má gestão.
Devolução aos cofres públicos de todo o capital público fornecido.
Proibição de inversão de bancos espanhóis em paraísos fiscais.
Regulação de sanções aos movimentos especulativos e às más práticas bancárias.
6. Tributação:
Aumentar a taxa de imposto sobre grandes fortunas e instituições bancárias.
Eliminação das IACV.
Volta do imposto sobre herança.
Controle real e efetivo de fraude fiscal e da fuga de capitais a paraísos fiscais.
Promoção a nível internacional da adoção de uma taxa a transações internacionais (Taxa Tobin).
7. Liberdades cidadãs e democracia participativa:
Não ao controle da internet. Abolição da Lei Sinde.
Proteção a liberdade de informação e de imprensa e ao jornalismo investigativo.
Referendos obrigatórios e vinculados às questões de grande relevância, que alteram a vida dos cidadãos.
Referendos obrigatórios para a introdução de medidas ditadas pela União Européia.
Modificação da Lei Eleitoral para garantir um sistema autenticamente representativo e voto proporcional que não discrimine nenhuma força política, na qual o voto em branco e o voto nulo também tenham sua representação no parlamento.
Independência do poder judiciário: reforma do Ministério Público para garantir sua independência, e acabar com a nomeação de membros para o Tribunal Constitucional e para o Conselho Geral do Poder Judicial por parte do Poder Executivo.
Estabelecimento de mecanismos efetivos que garantam a democracia interna nos partidos políticos.
8. Redução do gasto militar.
1 PP e PSOE – Partido Popular e Partido Socialista Operário Espanhol
2A Confederação Sindical de Comissões Operárias (CCOO) e a União Geral de Trabalhadores (UGT)

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