sexta-feira, 25 de março de 2011

Ficha Limpa cai no Supremo - Discurso da Senadora Marinor Brito
Senhor Presidente,
Senhores Senadores,
Senhoras Senadoras,  

A Lei Complementar nº 135 de 2010, conhecida como a Lei da Ficha Limpa, é um dos mais belos exemplos de como o povo pode participar diretamente das decisões políticas em nosso país. E, por meio da pressão social legítima, construir leis que sejam expressão da vontade da maioria.
Foram mais de um milhão e seiscentos mil de assinaturas de brasileiros e brasileiras que manifestaram sua concordância com um singelo princípio: para almejar representar o povo brasileiro o candidato não pode ter a ficha suja, não pode ter sido condenado por improbidade administrativa ou ter renunciado ao mandato para fugir da investigação sobre irregularidades cometidas.
A aprovação pelo Congresso Nacional atendeu a este verdadeiro clamor, mas também representou uma importante iniciativa de limpar a imagem combalida desta Casa, depois de tantos e tão freqüentes escândalos envolvendo parlamentares. Os últimos anos foram marcados por mensalões, quadrilhas assaltando recursos da saúde, apenas para citar alguns casos
Em relação aos posicionamentos dos ministros do Supremo na votação de ontem merece uma análise e uma resposta desta Casa os aspectos levantados pelo ministro Gilmar Mendes.O ministro afirmou que cabe aquela Corte “defender o cidadão contra sua própria sanha”. Disse  que “é preciso ter cuidado com esse interesse, o sentimento popular”. Em determinado momento, ao criticar o período de inelegibilidade estabelecido na Lei, o ministro afirmou que talvez esta Casa devesse ter uma consulta num psiquiatra. Disse que o “tema não é jurídico, é para a psiquiatria juridica”.
A postura deste Ministro sintetiza uma postura que vem se consolidando no STF, colocando um órgão que deveria garantir o cumprimento da Constituição como um órgão que legisla por cima de quem foi indicado para tal tarefa, no caso o Congresso Nacional. É uma afronta permanente ao Poder Legislativo.
Mas certamente ninguém conseguiu surpreender mais do que o novo ministro Fux. Tive a oportunidade participar de sua argüição nesta Casa. E relendo as notas taquigráficas desta sessão pude relembrar do Fux que veio pedir nossa aprovação. Destaquei alguns trechos dos seus pronunciamentos:
Sobre a Justiça ele disse:
 “(...) e justiça é algo que não se aprende, justiça é algo que se sente; os juízes sentem o que é justo. Assim o era no Direito Romano.
O que será que ele e os demais ministros do STF sentiram ao colocar na lata do lixo uma lei de iniciativa popular, aprovada pelo consenso de duas Casas Legislativas e que conta com ampla aprovação para que a mesma tenha validade para o pleito de 2010?
Sobre a sua ida para o STF afirmou:
“O senhor quer ir para o Supremo Tribunal Federal?” Eu disse: eu quero. Eu sonho com isso, porque eu acho que o soldado que não quer ir para o generalato tem que ir embora do Exército.
E conseguiu, chegou ao generalato, ao cargo mais alto que um juiz pode cobiçar. E qual foi a sua postura na primeira votação que participou? Virar as costas para o povo que, por meio dos seus representantes, lhe conferiu tão alta honra.
Em determinado momento afirmou que “é absolutamente inconcebível a politização do Judiciário”. E não foi justamente o contrário que presenciamos na votação de ontem no Supremo. Uma afronta a decisão política do povo brasileiro, tomada legitimamente pelo Congresso Nacional. Mais uma vez o STF decidiu extrapolar suas competências, politizou-se e afrontou a vontade do povo brasileiro.
Na argüição o senhor Fux foi enfático na defesa da soberania popular. Ele disse:
“No que toca à soberania popular, eu diria a V. Exª, com a exegese elástica, com a interpretação elástica que esse dispositivo oriundo da revolução americana ostenta, que todo poder emana do povo que o exerce por meio de seus representantes”.
Mas na primeira oportunidade ele decidiu escolher o lado daqueles que por meio da politização do judiciário, enterram a divisão e a harmonia entre os Poderes da República.
E finalizo as citações com seu posicionamento, mesmo que escorregadio, sobre a Lei da Ficha Limpa. Disse o ministro na oportunidade:
“(...) em relação à questão da ficha limpa, por exemplo, que efetivamente está sub judice, há dois critérios em contraposição: o critério da irretroatividade e o critério da possibilidade de o juiz poder individualizar, especificar a pena de cada caso concreto – isso não interferiria no processo eleitoral”.
Bem, fiz questão de ouvir atentamente o seu voto durante a sessão de ontem. E é claro que há uma enorme distância entre os dois Fux’s. Ontem ele disse ter-se convencido de que a anterioridade eleitoral é uma garantia para as minorias, que não se verão surpreendidas no ano da eleição com mudanças iminentes realizadas pela maioria, “muitas vezes impopulares”. De que maiorias e minorias o nobre ministro estava falando? A maioria do povo brasileiro se manifestou pela vigência da Lei Complementar em 2010, seja por meio dos seus representantes, que por decisão unânime aprovam a Lei da Ficha Limpa, seja pela consulta dos institutos de pesquisa sobre a questão.
As minorias, que foram barradas pela Lei da Ficha Limpa, estas sim se viram representadas no voto do senhor Fux.
E no mesmo voto fez coro com o conhecido Ministro Gilmar Mendes, ao dizer que a Lei aprovada por esta Casa “feriu também de morte a garantia da segurança jurídica, inerente à necessária estabilidade do regime democrático, e que se vê surpreendida – esta é a palavra – com a criação, no meio do jogo democrático, de novas inelegibilidades que, para, além de desigualar os concorrentes, surpreende a todos.”

Senhores Senadores,
Senhoras Senadoras,

O que está ferindo de morte a estabilidade do regime democrático é a persistência da corrupção em nosso país. O que tem levado a descrença em nossas instituições é a permanência no poder de políticos que compram voto, fraudam licitações, enriquecem a olhos vistos e são perdoados pela Justiça, tudo em nome da garantia da segurança jurídica. Estes senhores sentem-se plenamente representados e seguros com a decisão.
Porém, nós senadores, nossos colegas deputados federais, todos nós fomos eleitos pelo povo brasileiro para, de maneira indireta, representar os seus interesses, os interesses da maioria.
O Supremo Tribunal Federal deve proteger o povo da sanha das minorias, mas isso não foi feito no dia de ontem. Pelo contrário.
O ministro Fux, na sessão de argüição no Senado, havia defendido que se colocasse um “fim no mito da neutralidade do juiz”. Mesmo que por vias transversas, tenho que admitir que ele conseguiu ser coerente com esta idéia. Somente escolheu o lado errado.
Eu pergunto de maneira direta e indignada: quanto custou esta decisão para a democracia brasileira? Quanto custou esta decisão para a crença do povo brasileiro de que as instituições existem para proteger os interesses da maioria?
Cabe a esta Casa não deixar se desmoralizar pela politização do Judiciário. Cabe a esta Casa honrar o seu compromisso com a defesa dos interesses das maiorias.
E, cada segundo, cada minuto, cada hora e cada dia que eu estiver nesta Casa serão utilizados para protestar contra decisões que favoreçam minorias corruptas e enfraqueçam a crença do nosso povo em seus representantes e nas instituições da República.
A indignação que sinto não é pessoal, é coletiva. Externo o sentimento da maioria do povo brasileiro, duramente golpeado pela decisão do Supremo Tribunal Federal.
Não deixarei de travar todas as batalhas contra a possibilidade de que um dos mais notáveis “fichas sujas” retorne para esta Casa.
E estarei aqui lutando para que esta Casa não aceite subserviência nem no Executivo nem do Judiciário em relação as suas competências e decisões soberanas.
Muito obrigada.

Brasília, 24 de março de 2011.

Senadora Marinor Brito – PSOL/Pará

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