segunda-feira, 11 de julho de 2011

PL 116 entrega TV por assinatura para os monopólios estrangeiros
Projeto antinacional e antipopular seguiu para o Senado sem passar pelo Plenário da Câmara
Por Carlos Lopes


No momento em que escrevemos, ainda não se iniciara a terceira audiência pública do Senado sobre o PLC 116 (antigo PL 29, durante sua tramitação na Câmara). O projeto abre a TV por assinatura para as teles estrangeiras. A lei atual (Lei do Cabo) limita a participação de empresas estrangeiras na TV por assinatura a 49% das ações com direito a voto. O PLC 116 acaba com esse limite.
Algumas pessoas de boa fé, após matéria que apontava a Globo como sabotadora do projeto, saíram em defesa da aprovação imediata do PLC 116. Não sabemos se a matéria tem algo de verdadeiro, já que foi colhida na lavoura da “Folha de S. Paulo” - onde, em se plantando, tudo dá, sobretudo se o plantador for um banco ou uma tele multinacional. Mas é compreensível a ojeriza ao monopólio da Globo – basta, para indignar um vivente, aquele boneco sem recheio mental que apresenta o Jornal Nacional.
No entanto, se a solução para o monopólio da Globo for substituí-lo pelo monopólio do Murdoch, dono da Sky, ou pelo monopólio da AT&T, ou pelo monopólio da Telefónica, nós estamos lascados. Convenhamos, perto do que há na Fox News, até o Jornal Nacional parece um programa de notícias.
A questão é simples: o faturamento de todas as empresas de televisão em 2010, somando TV aberta e TV por assinatura, ascendeu a R$ 17,5 bilhões (cf. Projeto Inter-Meios/Relatórios).
O faturamento das teles foi R$ 156,2 bilhões no mesmo período, nove vezes o faturamento das empresas de televisão. Somente a Telefónica, isoladamente e sem somar qualquer lucro financeiro, faturou mais (R$ 21,3 bilhões) do que todas as empresas de televisão somadas (cf. Telebrasil, “O Setor de Telecomunicações no Brasil - 2010” e Teleco/Operadoras/Desempenho financeiro).
Note-se que, entre as empresas de televisão, nós somamos duas empresas de TV por assinatura (a NET e a TVA) que já pertencem, ainda que ilegalmente, às teles (uma à Telmex/AT&T e a outra à Telefónica). Portanto, a comparação é pior ainda para as empresas de TV.
Com esses números, existe alguma dúvida sobre o que significará a entrada das teles, sem qualquer limite, no setor de TV por assinatura? Quanto à brilhante solução de fundir a endividada Oi com a Record para se contrapor às estrangeiras, deve ser brincadeira. Será que já não basta a fusão da Telemar com a BR Telecom? Daqui a pouco o BNDES e o BB não vão fazer outra coisa senão carregar nas costas um monstrengo, agora com o aporte cultural da Record, até que as teles estrangeiras o engulam aos pedaços.
Essa é a origem das vicissitudes atuais do PLC 116. O problema é que o projeto, desde sua base, na cozinha do pequeno Bornhausen, está errado. Somente alguns cabeças de bagre (ou pessoas ludibriadas) podem apresentá-lo como a grande resposta ao monopólio da Globo ou a salvação da cultura nacional na TV por assinatura – se depender da Telefónica & quejandos, já se sabe para onde vai a cultura nacional.
Daí, um certo clima de furdunço, até positivo, que antecedia a audiência de quinta-feira.
Pelos problemas da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) - que reúne a Globo, a Record e o SBT -, pelas acusações das teles à Globo, pela oposição da Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA) – formada pela Bandeirantes e Rede TV -, pelos “questionamentos” da Associação Brasileira dos Programadores de TV por Assinatura (ABPTA) - que, por isso, rompeu com a Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), da qual fazia parte - e pelos demais participantes, a audiência deve ter sido interessante.
Dessas entidades, a Abert era “neutra”, depois foi quase contra (por um motivo, aliás, muito justo: “os radiodifusores são investidores nacionais, mas não poderão disputar com as teles se não houver um regramento que assegure a competição entre forças desiguais”, declarou, na última audiência, o seu diretor-geral, Luiz Roberto Antonik), e, agora, anunciou que “as Organizações Globo apoiam o projeto, desde que sofra algumas alterações de redação, o SBT é contra e a Record é a favor”.
A solução da Abert foi enviar à audiência quatro representantes – um da Globo, outro do SBT, outro da Record e um da TV Jangadeiro, do ex-senador Tasso Jereissati, que, apesar de sua carreira, é contra o PLC 116, pelas razões expostas por Antonik: porque não há chance alguma de “concorrer” com os monopólios de telecomunicação. Realmente, não é para isso que os monopólios existem. Monopólios não “concorrem”, monopólios usam seu maior poder financeiro para quebrar as outras empresas.
A Globo respondeu às teles que é a favor do projeto e – contrariamente ao anunciado pelo presidente da Abert – sua condição é que o projeto não seja modificado.
Já a Sky, é contra porque não quer “conteúdo nacional” algum – e não precisa do PLC 116, pois a Anatel isentou a TV por satélite de obedecer aos limites de capital estrangeiro da Lei do Cabo.
A favor, se manifestaram a ABTA (dominada pela Telmex/AT&T e pela Telefónica, que querem legalizar sua propriedade sobre a NET e a TVA) e a Associação Brasileira dos Produtores Independentes para TV (ABPI-TV), que tem como porta-voz um membro da família Civita.
Além desses, a Associação Brasileira de Produtores de Audiovisual (ABPA) e o Sindicato da Indústria de Audiovisual de São Paulo – aqui, há realmente quem produz e não tem espaço na TV; mas não vão ser as três horas e meia por semana (ou meia hora por dia) de “conteúdo nacional”, em alguns canais, em troca de entregar o setor a um cartel estrangeiro, que solucionarão esse problema. Até porque, mesmo que passem as cotas de conteúdo nacional, depois de estabelecido o monopólio absoluto das teles na TV por assinatura, é muito fácil derrubar esse item no Congresso.
Se o leitor achou essa descrição das posições dos participantes da audiência pública de quinta-feira parecida com a tradicional briga de foice no escuro, tem toda razão.
Os responsáveis são os deputados Bornhausen e Bittar, com a ajuda do deputado Lustosinha, que elaboraram um texto irresponsável, que não passou pelo plenário da Câmara, pois temiam que não fosse aprovado. Assim, tocaram um projeto que entrega um setor inteiro das comunicações ao capital estrangeiro em “caráter conclusivo” - recurso pelo qual basta ser aprovado nas comissões para que seja considerado aprovado pela Casa.
Sem discussão na Câmara, o texto do PLC 116 – cheio de expressões obscuras, falsos conceitos para enrolar trouxas, repleto de intenções não explícitas, mal feito e pensado pior ainda - teria de provocar uma confusão no Senado, apesar de vários senadores ainda não terem despertado para sua essência antinacional, monopolista, antipopular e antidemocrática.
No entanto, seus adeptos querem aprová-lo em “caráter terminativo” - isto é, outra vez sem discuti-lo nem votá-lo no plenário.

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