A força dos estudantes chilenos
Por Lucas Ferraz, de Buenos Aires, em Folha de S. Paulo
Estudantes chilenos ocupam sede de TV
Canal é ligado à família do presidente Sebastián Piñera; mais de 500 foram detidos em confrontos com a polícia
Mandatário usa decreto de Pinochet para impedir manifestações que não tenham sido aprovadas pelo governo
Em violentas manifestações ontem no Chile, estudantes invadiram uma rede de TV que era da família do presidente Sebastián Piñera.
Os distúrbios se iniciaram pela manhã, com confrontos com policiais. Estudantes protestam há três meses pela reforma do sistema educacional. Houve mais de 500 prisões e dezenas de feridos.
O conflito se intensificou após o governo proibir duas manifestações dos estudantes. Para impedir os protestos, Piñera usou um decreto assinado pelo ex-ditador Augusto Pinochet (1915-2006).
A medida reconhece o direito de realizar atos, desde que sejam antes aprovados pelo governo, que negou o direito sob o argumento de manter a "ordem pública".
Estudantes ignoraram a proibição e saíram às ruas, mas acabaram reprimidos.
Os manifestantes montaram barricadas em pelo menos dez pontos da capital, Santiago, e atiraram paus, pedras e coquetéis molotov, segundo imagens da TV local. A polícia agiu com jatos de água e gás lacrimogêneo.
À noite, os estudantes voltaram às ruas e invadiram a rede de TV Chilevisión, da qual Piñera se desligou após assumir a Presidência. Moradores da capital saíram às ruas em apoio aos estudantes.
Os novos distúrbios devem esfriar a tentativa de acordo para pôr fim aos protestos. O Ministério da Educação apresentou uma proposta, considerada insuficiente pelo movimento estudantil.Uma das principais demandas é que o ensino público seja gratuito.
Piñera havia dito nesta semana que não iria mais permitir manifestações de estudantes. O porta-voz do governo, Andrés Chadwick, disse também que os "estudantes não são donos do país".
A "primavera chilena" eclodiu em maio, com protestos nas ruas e a ocupação de várias universidades, e provocou grave crise no governo.
No último mês, o presidente reformou quase metade de seu gabinete para tentar melhorar a imagem do governo, que ostenta um dos piores índices de aprovação da história política do Chile.
O Centro de Estudos Públicos, um dos institutos mais respeitados do país, divulgou ontem uma nova pesquisa sobre a popularidade de Piñera, que segue em queda: ele tem apenas 26% de aprovação popular.
Estudantes chilenos recusam negociação
Movimento rejeita oferta sobre reforma educacional e exige ensino público gratuito
Por Lucas Ferraz, de Buenos Aires, em Folha de S. Paulo
Os estudantes chilenos rechaçaram ontem proposta do presidente Sebastián Piñera para tentar pôr fim à onda de protestos em prol de uma reforma da educação, que estourou no país há três meses.
Em decisão unânime, o movimento estudantil afirmou que o documento apresentado pelo Ministério da Educação nesta semana é "ideológico" e, em vez de fortalecer a educação pública, "pretende privatizá-la".
O rechaço ocorre um dia depois do maior conflito desde o início da "primavera chilena", em maio, quando estudantes saíram às ruas e ocuparam colégios e universidades em todo o país.
Os confrontos de anteontem resultaram em 874 detenções, 90 policiais feridos e na invasão temporária de uma emissora de TV.
Os estudantes anunciaram novos protestos nos próximos dias e deram prazo de seis dias para Piñera apresentar uma nova proposta.
Para tentar pôr fim à crise, o governo elaborou um documento que lista 21 medidas para tentar reformar o sistema de educação. Entre elas, mais verba para o ensino, mais bolsas de estudo e o comprometimento de considerar a educação uma garantia constitucional, como pedem os estudantes.
Mas a liderança do movimento estudantil considerou o documento insuficiente para acabar com o endividamento dos alunos com o ensino superior e -ponto mais importante- não torna a educação pública gratuita.
O último ponto é uma das principais demandas dos estudantes chilenos. Desde os anos 70, durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-90), o papel do Estado foi esvaziado na educação.
Cursar uma disciplina na Universidade do Chile pode custar cerca de US$ 8.000 por ano. Cerca de 40% dos estudantes chilenos deixam a universidade endividados.
O presidente Piñera, pressionado pelos distúrbios e com popularidade em baixa, pediu ontem no Twitter que seja firmado logo um acordo.
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